segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

Babel



Entre a extensa obra de Kilgore Trout, existe um conto intitulado “O idiota dançarino” e, diz-nos Kurt Vonnegut, “assim como muitas das histórias de Trout, era sobre um trágico fracasso de comunicação”. Nele, Zog, um alienígena de Margo – um planeta onde as pessoas se comunicavam peidando e sapateando – chegou à Terra com instruções para ensinar como prevenir guerras e curar o câncer. Logo que chegou, Zog viu uma casa em chamas e saiu – a seu modo – avisando as pessoas do que estava acontecendo. O chefe da família que morava na casa “matou Zog atingindo-o com um taco de golfe na cabeça”. Pois bem, Babel é um filme sobre peidos e sapateado.

O mote do filme são as dificuldades de compreensão e comunicação existentes no mundo moderno e que são amplificadas pelo fato deste tiny little world ter se tornado, no fim, uma Estrela da Morte globalizada (meu irmão diz que aí – e nos dois pontos – é puro Luhmann, ao que eu só posso concordar). É um ponto interessante, mas fácil de resvalar para besteiras apocalípticas. Felizmente o filme triunfa ao permanecer politicamente neutro ao mesmo tempo que propaga sua ideologia give peace a chance comunicativa.

Porém o filme é mais que um ensaio (escrito) e ele tem uma narrativa, aí a coisa encrespa: me dizem ser, na verdade, várias narrativas interligadas. Agora, há algo que pode acontecer de muito errado com essas histórias conectadas: elas podem dizer sê-lo e não o serem. Creio que histórias conectadas distribuem os personagens em núcleos sem uma ligação muito forte entre si (meu colegas que fizeram exatas podem compreender como uma ligação covalente); o que Iñarritu faz é uma ligação iônica. E a história sai do projeto inicial de dois modos: mostra coisas que mal tem a ver com o filme – embora seja seu melhor segmento, a parte japonesa – ou centra demais em alguns personagens e esquece outros: a família Jones. Como centra neles, acaba indo para um “melodrama para gente inteligente”. Afinal, como é que uma mesma família é atingida por um suposto atentado terrorista e seus filhos se perderem no deserto vítimas do preconceito americano com relação aos mexicanos? Eu sei que tudo pode ser simbólico, mas é só que acaba forçando uma carga emocional que poderia ter sido distribuída muito mais naturalmente (embora escapar aos planos não seja por si só ruim).

Outro ponto é que o filme se trai em sua “ocidentalidade” ao não desenvolver o suficiente a história da família marroquina ou ao mostrar um estereótipo dos mexicanos. É como se a narrativa ficasse mais complexa a cada nível (família marroquina – mexicanos – japoneses – americanos). Só que os personagens também - e ter uma vida pessoal fosse privilégio nosso e daqueles mais próximos (os dois últimos níveis apontados) – o que acaba por mostrar que há muito mais peidos e sapateado na tentativa do diretor de mostrar que we’re one but not the same do que gostaria de admitir.

Enfim, é fácil Babel não ser tudo aquilo que quer ser por sua pretensão e grandiloqüência. E ele realmente não é. Ter uma hora em que poderia ter acabado antes é, contudo, a única falha objetiva que detectei. Mas como filme é bom e te faz pensar um pouco, então é como um daqueles produtos da Polyshop que vem com brindes. Aproveite. Ah e lembrando, ideologicamente e musicalmente a trilha sonora é muito boa, misturando de tudo um pouco e com instrumentos estranhos sem ser world musica.

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